28. Segunda-Feira da VIII Semana do Tempo Comum

EVANGELHO DO DIA E HOMILIA (LECTIO DIVINA).

REFLEXÕES E ILUSTRAÇÕES DE PE. LUCAS DE PAULA ALMEIDA, CM

O DINHEIRO FALOU MAIS ALTO

            Um santo que faltou no calendário! É o que sempre me vem à mente, quando leio esta passagem do Evangelho. Alguém perguntou a Jesus – uma pergunta sincera de quem queria realmente saber – que é que devia fazer para ter como herança a vida eterna. “cumprir os mandamentos” foi a resposta de Jesus, que até enumerou pacientemente esses mandamentos: “Não matar, não come- ter adultério, não furtar, não levantar falso testemunho, não prejudicar a ninguém, honrar pai .e mãe” (Mc 10, 19). O jovem – São Mateus é que informa que ‘se tratava de um jovem (Mt 19, 22) – respondeu que tudo isso ele já praticava desde seus verdes anos. O Mestre não pôde deixar de envolvê-lo num olhar de infinita simpatia; e acrescentou: “Só te falta uma coisa: vai, vende tudo o que tens e distribui aos pobres, e terás um tesouro no céu. Então, vem e segue-me” (Mc 10,21 ). Mas aí aconteceu a decepção. O jovem era muito rico. Não teve coragem de renunciar à sua riqueza. Ele, que poderia ser um São Bento, um São Francisco de Assis ou um São Luiz Gonzaga, afastou-se cabisbaixo, entregue à pobreza de sua riqueza.

            Foi quando Jesus fez a grave admoestação: “Como é difícil os que têm riquezas entrarem no Reino de Deus!” (v. 23). E diante do espanto dos discípulos, completou ainda com mais veemência: “I:. mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus! ” (v. 25).

            A expressão é evidente- mente hiperbólica. Quer indicar alguma coisa humanamente im- possível. Mesmo assim, houve autores que se impressionaram com a desproporção entre os elementos da comparação, e acharam que o texto trazia originariamente outra palavra grega: “kámilos” (cabo, corda grossa) em vez de “kámelos” (camelo), É interessante que o Padre Vieira adotou essa versão. Outros acharam que “fundo de agulha” era o nome antigo de uma porta estreitíssima nos muros de Jerusalém. Mas é inútil querer recorrer a esses artifícios. Fica sempre a impossibilidade afirmada por Jesus.

            A expressão assustou profundamente os discípulos, que começaram a comentar: “Então quem se poderá salvar?” (v. 26). Mas Jesus, olhando bem para eles, disse: ” Aos homens é impossível, mas a Deus não; pois a Deus tudo é possível” (v. 27). E isso mesmo que temos que aprender: só a força da graça de Deus – em certos casos, um verdadeiro milagre – é que impede que o poder das riquezas subjugue o coração do homem, e mate aí a fé, o amor fraterno, a dedicação aos valores do espírito. O dinheiro torna árido o coração, fecha-o no egoísmo, impede que ele se abra na direção de Deus e dos irmãos. Todo o mal-estar que reina no mundo pela má distribuição das riquezas vem daí. Os donos de riquezas querem ficar cada vez mais ricos. E acabam oprimindo os pobres, fazendo-os ficar cada vez mais pobres. Mas não faltam milagres da graça de Deus, abrindo o coração de detentores de grandes fortunas, transformando-os em benfeitores da humanidade, sobretudo pelo exemplo de sua pobreza abraçada pelo reino dos céus. Basta- ria entre todos o exemplo luminoso do “poverello” de Assis.

            A liturgia da palavra deste domingo prepara o Evangelho com a leitura de uma perícope do Livro da Sabedoria, onde o sábio bíblico – tentou-se identificá-Io com Salomão, mas é uma opinião hoje considerada insustentável – declara que pediu a Deus o espírito de Sabedoria, e o recebeu.

            E que a prefere a todos os cetros e tronos e riquezas. Perto dela todo o ouro do mundo é como um punhado de areia, e a prata vale menos do que a lama. Essa sabedoria é a que leva o homem a descobrir a mão de Deus nas obras da criação, dá-Ihe o espírito de gratidão e de prece, ordena sua vida segundo os preceitos da ética: a do Sinai e, mais ainda a do Evangelho.

            Se o homem adotasse esse conselho do sábio bíblico, seria capaz de construir um mundo mais feliz. E descobriria no fim o que o sábio descobriu a respeito da posse da sabedoria: “Todos os bens me vieram com ela, e havia em suas mãos riqueza incalculável” (Sb 7, 11 ).

Mc 10, 17-30 (ou: 10, 17-27).